em voz alta, tão logo a rouquidão se achasse, o silêncio se alastraria ao longo de decênios e mesmo aí não estaríamos no fim. Não posso te dizer. Que essas palavras todas gastas, presas na boca de tanto uso, são mais mudas quando ditas que quando caladas, porque não são o que é, não são o que sou. E não posso me dizer. Cá estou, mas não da maneira como tu esperas encontrar.
do que é que o tempo se atenta a dizer às coisas da vida. sabe-se mais, e há pouco sabe-se nada. Mas, se é verdade, creio, os instantes passam e nem tudo que envelhece ganha idade, há o que renasça.
a mim já bastava um olhar adaga, que memória também é jeito de perfurar os tempos. mas tu me cais a íris, abrindo distância dos meus pés e já não te sei dizer os ais.
sou uma fotografia envelhecendo. certas vezes sinto que estou parada no tempo, outras, percebo os vários tempos parando em mim. minha tentativa de controlar o instante [um par de semibreves que a chuva faz quando anuncia que não vai mais cair] é o bolor das horas seguintes. essas pernas que me andam enferrujam o presente. finjo marcar caminhos, mas em verdade espero que os caminhos me marquem.
os poetas também mudam de casa. quando se cansam de riscar o chão e descortinar o céu, passam a desabreviar o calor em tantos graus que se consiga transitar entre o elo perdido do tesouro e o nada.